terça-feira, 10 de março de 2015

POEMA "AS MINHAS ASAS" DE ALMEIDA GARRETT


"AS MINHAS ASAS"

Eu tinha umas asas brancas
Asas que um anjo me deu,
Que, em me eu cansado da terra,
Batias-as, voava ao céu.

Eram brancas, brancas, brancas
Como as do anjo que m'as deu:
Eu inocente como elas,
Por isso voava ao céu.
Veio a cobiça da terra.
Vinha para me tentar,
Para seus montes de tesouros
Minhas asas não quis dar.
Veio a ambição cóas grandezas,
Vinham para m'as cortar, 
Davam-em poder e glória,
Por nenhum preço as quis dar.

Porque as minhas asas brancas,
Asas que um anjo me deu, 
Eu me eu cansado da terra
Batias, voava ao céu.

Mas uma noite sem lua
Que eu contemplava as estrelas,
E já suspenso da terra,
Ia voar para elas,

Deixei descair os olhos
Do céu alto e das estrelas...
Vi entre a névoa da terra
Outra luz mais bela que elas.

E as minhas asas brancas
Asas que um anjo me deu,
Para a terra me pesavam
Já não se erguiam ao céu.

Cegou-me essa luz funesta
De enfeitiçados amores...
Falta amor, negra hora
Foi aquela hora de dores!

Tudo perdi nessa hora
Que provei nos seus amores
O doce fel do deleite,
O acre prazer das dores.

E as minhas asas brancas
Asas que um anjo me deu,
Pena a pena me caíram...
Nunca mais voei ao céu.

ALMEIDA GARRETT
(1799-1854)

Sem comentários: