terça-feira, 22 de agosto de 2023

SARA F. COSTA: UM AGRADECIMENTO PÚBLICO (2003-2023)

 


SARA COSTA: UM AGRADECIMENTO PÚBLICO (2003-2023)

Num post que eu publiquei aqui no dia 26 de Abril do corrente ano, quando dissertei acerca da revolução que a minha ida ao 10Cíbeis Bar provocou em mim naquele longínquo ano de 2003, mencionei também a existência de uma rapariga e de um livro que tinha mudado a minha vida e que iria falar numa outra ocasião. Essa ocasião chegou hoje por que faz precisamente neste dia, 22 de Agosto, 20 anos que conheci essa mesma pessoa e esse livro que despertou a minha vocação literária e revelar o escritor e poeta que sou hoje.

Com a minha saída da Califa a 28 de Fevereiro do ano seguinte à revolução de 26 de Abril de 2003 no 10Cíbeis Bar em São João da Madeira, atravessei uma transformação tão grande que fez da reviravolta do ano anterior uma breve passagem da minha vida, comparada com o que estava a viver e a sentir naquele tempo. Pode parecer estranho mas, naquela altura, o 10Cíbeis era mais do que um simples bar onde se ouvia música, bebia-se uns copos e trocava-se umas impressões. Longe disso. Era um verdadeiro pólo cultural em miniatura e ponto de encontro de músicos, actores, pintores, desenhadores, filósofos e até poetas. Quem passasse por lá numa sexta-feira ou num sábado à noite costumava encontrar jovens a trocar impressões sobre os mais variados assuntos que iam desde a última bebedeira, a aventura mais tresloucada, passando por um conflito internacional até ao último disco que compraram ou estiveram a ouvir ou até mesmo o último livro que leram. Da mesma forma que era tão comum assistir a festivais e concertos de bandas de Rock e de Metal como peças de teatro e tertúlias à fogueira, no pátio das traseiras, explodir de êxtase e loucura em noite loucas de rock e de metal até de madrugada ou mastigando o tédio em noites vazias como foi a do dia 22 de Agosto de 2003.

Eu e o meu amigo e vizinho Rui Silva estávamos prestes a sair mais cedo do 10cíbeis nessa noite. Tinha terminado o curso de Microsoft Office Excel na Triângulo Norte, Lda. e queria comemorar com os meus amigos. Normalmente, as sextas-feiras costumavam estar apinhadas de gente no centro da cidade. Aquela noite fora uma excepção à regra. A música e o ambiente dentro do bar deixavam muito a desejar e como o bar estava em obras por dentro, a maior parte das pessoas resolveu sentar-se nas lajes da antiga loja da Portugal Telecom (antiga loja MEO). Insatisfeitos com o mau ambiente do bar, resolvemos fazer o mesmo. O que encontrei lá fora marcou para sempre a minha vida.

Assim que saí do 10cíbeis e dirigi-me para uma das lajes, para me sentar, qual não foi o meu espanto quando encontro sentada a fumar numa dessas lajes, ao lado do Rui “Paradise” Arêde e da Juliana Seabra, uma rapariga lindíssima, trajada e adornada de toda a parafernália gótica dos pés à cabeça, de cabelos compridos, lisos, negros e sedosos como as asas de um corvo, olhos castanhos-escuros como sombras e com sorriso mais puro e branco que a lua que brilhava naquela noite. Seu nome, Sara Costa.
Encantado e curioso por conhecer aquela rapariga, perguntei-lhe se podia sentar-me a seu lado. Ela assentiu, conformada. Em poucos minutos, não só fiquei a saber o seu nome e os seus gostos musicais por bandas de metal mais pesadas e soturnas como Dimmu Borgir, Crematory e Theatre of Tragedy, como também do seu gosto por declamar e escrever Poesia, estudar Filosofia, Arte, Teatro e livros de grandes autores contemporâneos como Franz Kafka ou José Saramago. Nada disso seria de espantar se não fosse o facto de essa rapariga ter, nessa altura, apenas dezasseis anos.

Estupefacto pela maturidade intelectual e cultural que demonstrava, não me deixei abater pelo espanto e continuei a trocar impressões com aquela esbelta adolescente. Continuámos a falar de Arte, de Música, de Poesia e de Literatura. Quando lhe perguntei que livro estava a ler, tirou do seu tiracolo um livro muito estranho de capa negra, com a figura soturna de um homem a tentar esconder o seu rosto. Chamava-se “Horto de Incêndio” e fora escrito por um poeta português falecido em 1997 chamado Al Berto. A minha curiosidade fez-me pegar nesse livro e ler o primeiro poema.

Recado

Ouve-me
que o dia te seja limpo e
a cada esquina de luz possas recolher
alimento suficiente para a tua morte

vai até onde ninguém te possa falar
ou reconhecer – vai por esse campo 
de crateras extintas – vai por essa porta
de água tão vasta quanto a noite

deixa a árvore das cassiopeias cobrir-te
e as loucas aveias que o ácido enferrujou
erguerem-se na vertigem do voo – deixa
que o outono traga os pássaros e as abelhas
para pernoitarem na doçura
do teu breve coração – ouve-me

que o dia te seja limpo 
e para lá da pele constrói o arco de sal
a morada eterna – o mar por onde fugirá
o etéreo visitante desta noite

não esqueças o navio carregado de lumes
de desejos em poeira – não esqueças o ouro
o marfim – os sessenta comprimidos letais 
ao pequeno-almoço.

O tempo congelara durante aqueles escassos minutos de leitura daquele poema estranho, mas estonteante. Tudo o que pensara acerca da Poesia contemporânea portuguesa naquela altura caíra por terra. O poema daquele poeta de origem alentejana remoera-me as entranhas da alma como um terramoto. Nunca tinha lido um poema tão visceral, soturno, surreal, inebriante e escandalosamente belo como aquele. Parecia ter escutado a voz de Deus naquele poema. Meio atordoado com aquela revelação, disse à Sara aquilo que eu sentia quando acabei de o ler. Ela sorriu e transpareceu o sorriso da sua alma no seu olhar. De seguida, perguntei-lhe que poetas mais gostava para além deste. Ela, não se fez rogada e falou-me de Mário de Cesariny, David Mourão-Ferreira, António Maria Lisboa, Edgar Alan Poe, Rimbaud e Mário de Sá-Carneiro. Por volta das 00H30, trocámos os nossos números de telemóvel e despedimo-nos. Naquela noite, sentira ter descoberto mais do que uma bela rapariga.

O que acontecera comigo depois desse dia fora uma verdadeira revolução. Tal como uma obsessão, a Literatura começou a ter mais importância para mim do que a música. Acaso ou influência do encanto que tive pela Poesia de Al Berto e por aquela bela adolescente gótica, comecei a procurar e a ler livros de contos e de poesia portuguesa e estrangeira na biblioteca dos meus pais e a reler alguns livros que tinha começado a ler durante o tempo da Faculdade. E nem a Biblioteca Municipal da minha terra escapou à minha sede por Literatura e Poesia. Três dias depois de conhecer a Sara, frequentara quase todos os dias a Biblioteca pública da minha terra como um verdadeiro crente em direcção ao seu templo para orar e meditar ao seu Deus, no silêncio branco das suas quatro paredes. E não começara por nenhum livro ao acaso; começara exactamente pelos livros dos poetas que influenciaram a jovem que começara a fazer parte da minha vida e dos meus sonhos mais secretos. Foram tardes e tardes de leituras envolventes de alguns clássicos da literatura universal, principalmente de Poesia, assim como alguns contemporâneos. A minha avidez por Poesia fora de tal forma que cheguei ao cúmulo de copiar poemas de grande autores nacionais e estrangeiros à mão, apenas para decorar e sentir na pele o peso do silêncio das suas palavras. Quando dera por mim, estava novamente a escrever poemas.

A Poesia que começara a escrever a partir de Agosto de 2003 era ainda mais soturna e melancólica que aquela que eu escrevera quando estudava na Lusíada. Falava de sonhos bizarros, paisagens nocturnas e depressivas, confissões melancólicas, pesadelos surrealistas carregados de uma imagética forte e lucífuga, fortemente influenciados pela poesia que estivera a ler desde o verão daquele ano e pela voz poética daquela adolescente gótica de sorriso lunar e olhos doces como os pastéis de Belém que comia na minha infância em Lisboa. Alguns deles mereceram rasgados elogios por parte dos meus novos amigos e amigas que conheci no 10cíbeis. A Sara fora das primeiras a dizer que não parasse de ler e de escrever, um incentivo que ainda me deu mais alento para fazer da Poesia uma necessidade básica e menos um mero passatempo, ao contrário do seu amigo e poeta Oliveirense, Luís de Aguiar, que conheci no dia 17 de Outubro de 2003, que pouco ou nada ligou para aquilo que eu pensava quanto menos escrevia. Curiosamente, foi o quarto candidato a músico que me contactou em 2001, quando estava à procura de músicos para fundar a minha primeira banda. Até os meus pais ficaram impressionados quando lhes mostrei um dos meus novos poemas em Janeiro de 2004.

É por isso que hoje, 22 de Agosto de 2023, faço o meu agradecimento público à minha querida e sempre linda amiga poeta Sara F. Costa que, sem se aperceber do impacto que o nosso encontro e leitura que fiz daquele poema daquele livro provocaram na minha vida, transformou este seu amigo num ávido leitor e no escritor e poeta que todos vocês hoje conhecem.

Parabéns e muito obrigado por tudo, Sara!

Tiago Moita. 

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sábado, 19 de agosto de 2023

TIAGO MOITA TESTEMUNHA CURADORIA DE ADRIANA HENRIQUES EM GONDOMAR 2023

 



TIAGO MOITA TESTEMUNHA CURADORIA DE ADRIANA HENRIQUES EM GONDOMAR 2023

No dia 5 de Agosto do corrente ano, tive o privilégio de assistir à exposição "100 artistas de Gondomar 2023", na Sala D' Ouro no Pavilhão Multiusos de Gondomar, do qual a minha amiga artista plástica Adriana Henriques foi uma das suas principais curadoras.

Este vídeo que partilho no mural do meu facebook é o meu testemunho sobre o que assisti e experienciei dessa magnífica exposição que recomendo vivamente e que termina no dia 31 deste mês.

Parabéns, Adriana!

Tiago Moita. 

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