"WE ARE WELCOME TO ELSINORE"
Entre nós e as palavras
Há metal fundente.
Entre nós e as palavras
há hélices que andam
E podem tirar-nos a morte
Violar-nos
Tirar do mais fundo de nós
o mais útil segredo
Entre nós e as palavras
há perfis ardentes
Espaços cheios de gentes de costas
Altas flores ventosas, portas por abrir
E escadas e ponteiros e crianças
sentadas
À espera do seu tempo e do seu
precipício
Ao longo da morada em que habitamos
Há palavras de vida, há palavras de morte
Há palavras imensas que esperam por nós
E outras frágeis, que deixaram de esperar
Há palavras acesas como barcos
E há palavras homens, palavras que
guardam
o seu segredo e a sua posição.
Entre nós e as palavras, surdamente
As mãos e as paredes de Elsinore.
E há palavras nocturnas
palavras gemidos
Palavras que nos sobem elegíveis
à boca
Palavras diamantes palavras nunca
escritas
Palavras impossíveis de escrever
Por não termos connosco
cordas de violinos
Nem todo o sangue do mundo
nem todo o amplexo do ar
E os braços dos amantes escrevem
muito alto
Muito além do azul onde oxidados
morrem
Palavras maternais só sombra só
soluço
só espasmo só amor só solidão desfeita
Entre nós e as palavras, os emparedados
Entre nós e as palavras, o nosso dever
falar.
MÁRIO DE CESARINY
(1923-2006)
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