domingo, 19 de maio de 2024

FUGAS POÉTICAS: DEZ ANOS DEPOIS (2014-2024)

 


Tiago Moita dando início à primeira sessão "Poesia à Solta" -

A 1.ª Fuga Poética em São João da Madeira (Neptúlia Snack-Bar,

Terça-feira, 20 de Maio de 2014, 21H30)


FUGAS POÉTICAS: DEZ ANOS DEPOIS


Quando eu e o meu amigo escritor e poeta Edmundo Silva inaugurámos as Fugas Poéticas no Neptúlia Snack-Bar, no dia 20 de Maio de 2014 (e na Confeitaria Colmeia, no dia 3 de Junho do mesmo ano), em São João da Madeira, fizemo-lo com o intuito de não só criar hábitos de leitura e ouvir (bem como dizer) Poesia, como o de cruzar outras artes através dela e dinamizar a cultura, o associativismo, o sentimento de comunidade e a cidadania para fora dos espaços públicos municipais, passando a fazer dos cafés autênticos espaços de convívio, cultura, cidadania e liberdade, onde cada pessoa que nela assistisse e participasse era sempre tratada com igual respeito e parte de uma grande família.

E foi com base nesses propósitos que eu e o Edmundo coordenámos as Fugas entre 20 de Maio de 2014 e 21 de Julho do ano seguinte, num ambiente familiar, informal, livre e democrático onde se cruzaram pessoas dos mais variados estratos sociais, fossem naturais da nossa terra, fossem oriundos de outros concelhos dos distritos de Aveiro e do Porto, cantando canções, tocando instrumentos, lendo ou declamando poemas dos mais diversos poetas portugueses e estrangeiros, mais ou menos conhecidos do grande público. Nesse tempo, homenagearam-se poetas, temas, grandes figuras da nossa terra como foi o caso do nosso professor Josias Gil, travaram-se amizades, revelaram-se leitores (que até foram buscar livros da Biblioteca Municipal de São João da Madeira sob nossa recomendação), diseurs e alguns poetas e chegou-se mesmo a incluir uma das nossas Fugas no programa do Poesia à Mesa em 2015.


Edmundo Silva inaugurando a primeira sessão "Poesia à Solta"
- a primeira "Fuga Poética" em São João da Madeira -
(Neptúlia Snack-Bar, terça-feira, 20 de Maio de 2014, 21H30)


Quando nós resolvemos sair da coordenação e passámos o testemunho a uma equipa, formada por um grupo de tertulianos amantes das Fugas Poéticas, inconformados com a nossa saída abrupta deste evento que inaugurámos na nossa terra com muito orgulho e dedicação, a 21 de Julho de 2015, tratei de prepará-los em duas reuniões preparatórias entre Julho e Setembro desse ano, transmitindo-lhes bons conselhos e ensinando-lhes tudo o que precisavam de saber para continuarem a manter o propósito e a natureza das Fugas Poéticas, tal como as deixámos desde 2014.

Tal não aconteceu. E mal começaram as Fugas Poéticas a serem coordenadas pela primeira equipa de coordenação que as mudanças fizeram-se sentir, desde o primeiro momento. Em vez de informalidade, começou-se a formalizar tudo com folhas de presença e homenagens póstumas. Em vez de se manter um ambiente espontâneo, livre, incondicional, inclusivo e democrático, optaram por criar um ambiente rígido, condicional, exclusivo e conservador. Em vez de se trazer o Poesia à Mesa para junto das Fugas Poéticas, as Fugas Poéticas passaram a participar no Poesia à Mesa, através da sua equipa de coordenação, excluindo os restantes tertulianos. Em vez de se comemorarem as Fugas Poéticas em Maio, dizendo poemas nos espaços onde eram feitas, comemoraram-se em Junho em restaurantes de luxo. Em vez de se tirarem fotografias de grupo no final de cada aniversário tiraram-se fotografias apenas à equipa de coordenação, excluindo-se todos os restantes. E o resultado ficou à vista: pouco a pouco, as pessoas foram abandonando as Fugas e nunca mais voltaram. A pandemia e o confinamento provocado pela Covid-19 em Março de 2020 deram o golpe de misericórdia, e nem o seu famigerado regresso em 2022, na antiga confeitaria Corpini, foi capaz de recuperar o seu antigo brilho.

Todos os eventos têm um princípio e têm um fim, mas muitos fins podem e devem ser evitados consoante as medidas que se tomam e as lições que cada pessoa, grupo ou organização retira dos erros que comete. Errar é humano, mas persistir no erro é condenar qualquer iniciativa ao fracasso. Gostaria muito que não fosse assim e que as Fugas não fossem apenas um grupo de pessoas que se serviu do seu nome para dizer poemas no Poesia à Mesa, tivessem mantido o seu propósito fundador e continuado até aos nossos dias. Tal não aconteceu, mas o seu exemplo e marco que deixaram na história de São João da Madeira deveria não só ser (mais) um motivo de orgulho e de iniciativa do povo sanjoanense como uma oportunidade para reflectirmos acerca da vida cultural do nosso concelho.


Tiago Moita

Escritor, poeta e formador

20.05.2024


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